José de Souza Larcher foi contemporâneo de Eça de Queirós. Eça esteve uma vez no Egipto, para assistir à inauguração do Canal de Suez (em 1869); Larcher fez duas viagens ao Egipto (em 1894 e 1898). Ambos visitaram a cosmopolita Alexandria, além de Port Said e do Cairo por onde também andaram. Os dois deixaram as várias impressões recolhidas patentes entre trabalhos literários editados. No entanto, José de Souza Larcher é muito menos conhecido do que o grande romancista.

Infelizmente, não existe ainda uma biografia devidamente elaborada sobre esta figura da segunda metade do século XIX português. Não obstante, é possível reconstituirem-se, com relativa exactidão, vários dos aspectos e momentos fundamentais da sua existência, principalmente graças ao texto de Souza Quintella publicado, em 1883, na Galeria Republicana

Descendente da família Larcher, oriunda de França e instalada em Portalegre desde 1774, nasceu nessa cidade alentejana (5 de Maio de 1821), filho de António Larcher e de Margarida Thomasia de Sousa. Embora originário de uma família de industriais no ramo dos lanifícios, arreigadamente monárquica, liberal e cartista, José de Sousa Larcher viria a ser um empenhado propagandista das ideias e dos ideais republicanos, designadamente no período que antecedeu a implantação do novo regime em Portugal. 

Mudou-se para Lisboa, em 1834 (com 13 anos), para estudar, primeiro na Academia Real da Marinha e, depois, na Escola Polytechnica. Na capital residiu com os seus tios Joaquim Larcher e António Aluísio Jervis de Atouguia. O primeiro era advogado, com grandes relações políticas, comerciais e culturais e que desempenhava importantes cargos políticos e administrativos, nomeadamente como par do reino vitalício e hereditário. O segundo, 1º visconde de Atouguia, casado com a sua tia Cândida Larcher, era, à época, Ministro da Marinha. Em casa de seus tios privou e frequentou reuniões com grandes vultos da época, reconhecidos e notáveis liberais, como Mouzinho da Silveira, Almeida Garrett e José Maria Grande, que ajudaram a moldar o seu espírito e carácter e a familiarizar-se com a Política e o Liberalismo. 

Alguns anos mais tarde, foi estudar e estagiar, em Paris, na École Centrale des Arts et Manufactures, onde se formou em engenharia, regressando a Portalegre, em 1842 (21 anos), onde, após a morte do pai, em 1849 (28 anos), assumiu funções públicas e administrativas e de gestão na fábrica da família, associando-se com o seu primo e cunhado José d’Andrade e Sousa na firma Andrade & Larcher, e na agência do Banco de Portugal.  Em 1866 e 1868 foi um dos directores da Companhia da Fábrica Nacional de Lanifíicos de Portalegre (S.A.).

Por essa altura, era já casado com Domingas de Andrade e Sousa, sua prima (16 de Abril de 1844), e pai de três filhos, Carlos de Sousa Larcher (2 de Janeiro de 1845), Maria Cândida de Sousa Larcher (14 de Junho de 1846), e Alberto de Sousa Larcher (27 de Janeiro de 1848), pelos quais, para acompanhar a sua educação, se mudaria novamente para Lisboa. 

Já com 50 anos, em 1871, passa a dedicar-se em exclusivo à administração pública e à política, aderindo, em 1880, ao Partido Republicano. tendo sido, por exemplo, vereador no município de Lisboa entre 1893 e 1896. 

Em 1894 e 1894 visitará o Egipto a convite do seu filho Alberto, que era juiz nos Tribunais Mistos, na sequência das quais publicaria, em 1901, por Mello d’Azevedo Editor, a obra, em dois Tomos, Impressões de Viagem. O que eu vi e ouvi atravez do Egypto e da velha Europa

Faleceria a 3 de Janeiro de 1913, com 91 anos, pouco mais de dois anos depois de ser implantada a Primeira República Portuguesa, a 5 de Outubro de 1910.

Como respeitado militante ligado ao ideário republicano, surge representado no célebre quadro a óleo, de 1913, hoje no Museu de Lisboa, A Cidade de Lisboa elege a sua primeira Vereação (O Sufrágio), da autoria de Veloso Salgado, pintado para assinalar a vitória republicana nas eleições municipais de Lisboa de 1 de Novembro de 1908, ao lado de outros distintos republicanos como Manuel de Arriaga, António José de Almeida, Teófilo Braga, Bernardino Machado.

 

Bibliografia: 

BARATA, Ana Maria dos Santos Cardoso de Matos Temudo (1997), Ciência, Tecnologia e desenvolvimento industrial no Portugal Oitocentista. O caso dos lanifícios do Alentejo. Tese de Doutoramento em História Contemporânea, Universidade de Évora.

GOUVEIA, Beatriz do Vale Neves (2020), Veloso Salgado: Estudo e Intervenção de Conservação e Restauro do Espólio doado ao Museu Nacional de Arte Contemporânea do Chiado – Relatório de Estágio, Tomar, Instituto Politécnico de Tomar.

LARCHER, Fernando Oudinot (2019), “Oficiais e Pares do Reino Jayme e Fernando Larcher" in Comissão Portuguesa de História Militar. O Liberalismo e os Militares em Portugal -  Actas do XXVII Colóquio de História Militar: 59-107. Lisboa, Comissão Portuguesa de História Militar.

“Larcher (José de Sousa)” in Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, Vol. XIV: 702.

SALES, José das Candeias; MOTA, Susana. “As impressões do Egipto de José de Souza Larcher”, in Martínez, Lucía Brage, Iria Souto Castro (eds), Antigüedades de Oriente Próximo y del Egipto faraónico. Aportaciones de la investigación española y portuguesa. la Editorial Universidad de Sevilla (No prelo).

SOUZA QUINTELLA (1883), “José de Souza Larcher", Galeria Republicana, nº30: 1-3.

 

Autor: 
José das Candeias Sales (Universidade Aberta, Centro de Estudos Globais da Universidade Aberta); Susana Mota (Universidade Aberta, Centro de Estudos Globais da Universidade Aberta)